
Uma reflexão sobre os mensageiros que moram por trás dos sintomas
Se você se sentiu visto em alguma das nossas conversas esta semana, este texto é o meu abraço em palavras. É um reconhecimento à coragem silenciosa de quem vive com uma mente que funciona de um jeito diferente, de quem trava uma batalha diária que a maioria das pessoas não consegue enxergar.
Muitas vezes, o que julgamos em nós mesmos como “preguiça”, “falha de caráter”, “mau humor” ou “caos” é, na verdade, um conjunto de mensageiros exaustos. São sinais que nossa mente e nosso corpo nos enviam para comunicar uma necessidade, um medo profundo ou uma sobrecarga que não conseguimos mais suportar.
O grande problema é que vivemos em um mundo que prefere rótulos fáceis a histórias complexas. E esses rótulos, quase sempre baseados em mitos, criam uma barreira de silêncio e solidão. Esta semana, nos dedicamos a quebrar alguns deles.
Quebrando os Mitos que nos Aprisionam
A informação correta é a primeira ferramenta para o acolhimento. Quando entendemos o que realmente se passa, a autocrítica feroz começa a dar lugar à autocompaixão. Vamos revisitar as verdades por trás dos mitos que conversamos:
- MITO: “TOC é só mania de organização.”
- A VERDADE: Vimos que o Transtorno Obsessivo-Compulsivo é uma prisão mental. É um ciclo de sofrimento onde pensamentos intrusivos e aterrorizantes (obsessões) geram uma ansiedade tão esmagadora que a pessoa se sente forçada a executar rituais (compulsões) para obter um alívio temporário. A perfeição que vemos por fora é a jaula de um medo profundo por dentro.
- MITO: “Depressão é apenas sentir uma tristeza profunda.”
- A VERDADE: Descobrimos que a depressão é uma mestra dos disfarces. Ela pode se manifestar como uma irritabilidade constante, um “pavio curto”, um cansaço que nunca passa, dores físicas sem explicação e uma apatia que rouba o prazer de viver (anedonia), mesmo sem a presença de lágrimas.
- MITO: “Toda pessoa com TDAH é hiperativa e inquieta.”
- A VERDADE: Exploramos o universo do TDAH em adultos e vimos que a apresentação predominantemente desatenta é extremamente comum. É a mente que funciona como um navegador com 50 abas abertas, resultando em caos criativo, procrastinação e uma batalha constante com a organização, sem necessariamente haver agitação física.
- MITO: “Transtorno Bipolar é o mesmo que ter ‘mudanças de humor’.”
- A VERDADE: Entendemos que a Bipolaridade envolve episódios de humor extremos e duradouros. Não são flutuações do dia a dia, mas verdadeiras “estações” de mania (euforia e energia excessivas) ou depressão profunda, que impactam drasticamente a capacidade da pessoa de funcionar.
O Convite: E se Você Parasse de Lutar?
Ao desmistificar essas condições, um fio invisível conecta todas elas: os sintomas não são o problema, são o alarme. E de que adianta brigar com o alarme de incêndio em vez de olhar para o fogo?
A nossa cultura nos treina para lutar. Lutar contra a tristeza, contra a distração, contra a ansiedade. Mas essa luta é exaustiva e, na maioria das vezes, inútil. O verdadeiro poder de transformação não está na resistência, mas na escuta.
O convite que deixo para você é: e se, em vez de tentar silenciar o mensageiro, você o acolhesse com curiosidade e perguntasse: “O que você está tentando me dizer? Qual a sua intenção positiva para mim?”. A irritabilidade pode estar pedindo por limites. O caos pode estar pedindo por um sistema que funcione para a sua mente, e não contra ela. A obsessão pode estar pedindo por segurança e paz interior.
A Beleza da Nossa Mistura
Sua experiência não é apenas válida; ela é profundamente humana. Ao final desta semana de reflexões, quero que uma mensagem fique com você.
Talvez a grande beleza da vida seja justamente abraçar essa mistura: seguir em frente com nossas forças e nossas fragilidades, com toda essa “bagunça” boa que nos torna humanos. Você não precisa “se consertar”. Você só precisa aprender a caminhar com todas as suas partes, acolhendo a jornada com mais gentileza.
E isso, por si só, é o ato mais corajoso de todos.